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Resistindo bravamente, a livraria Fonomag importa mangás e outras revistas/livros diretamente do Japão há mais de 30 anos.
O bairro da Liberdade em São Paulo mudou. Muito.
De um núcleo dos imigrantes japoneses durante meio século, a ponto de nos anos 1970/80 quase todas as lojas em suas ruas principais (Galvão Bueno, da Glória e Barão de Iguape) ostentarem cartazes escritos em japonês, três cinemas exibindo apenas filmes nipônicos, mercadinhos especializados em alimentos japoneses, quase um cento de restaurantes e bares que pareciam importados de Tóquio, uma dezena de livrarias que importavam e vendiam apenas livros/revistas/mangás do Japão (algumas delas
alugando mangás por 10% do valor de capa/dia), o dobro disto de sebos (sim, existiram sebos que vendiam exclusivamente mangás e revistas japonesas usadas), nos últimos quinze anos a Liberdade sofreu uma gradual mas constante invasão dos imigrantes chineses. Eles foram comprando as lojas, mercados, livrarias e praticamente todos os hotéis do bairro, a ponto de atualmente existirem restaurantes e lojas chinesas aos montes, e até mesmo uma livraria chinesa na Avenida Liberdade (sim, lá vende alguns
Manhua - o quadrinho chinês). A prova definitiva que a Liberdade deixou de ser um bairro da colônia japonesa para se tornar um bairro "oriental" é a comemoração do Ano Novo Chinês com toda a pompa e circunstância em plena Praça da Liberdade - coisa inimaginável quinze anos atrás.
No rastro destas mudanças, as livrarias japonesas da Liberdade foram fechando na mesma proporção que o bairro mudava, e atualmente só existem poucas delas, sendo a Fonomag - o foco desta matéria - a maior.
Eu conheci a Fonomag no começo dos anos 1980, quando existia uma locadora de fitas VHS japonesa em cima dela, onde a muito custo me tornei sócio e pude alugar as primeiras fitas com animes da minha vida - os movies da série Gundam. Mas isso fica para outra matéria. Voltando a Fonomag, fui cativado desde que a conheci por um simples motivo: os atendentes recebiam muito bem clientes brasileiros - ou melhor - clientes não descendentes de japoneses. Nas demais livrarias japonesas da Liberdade, que nesta época eu visitava regularmente, havia uma forte dose de antipatia e hostilidade velada por parte dos atendentes - sempre japoneses de idade avançada. Eles deixavam estampado bem claro em seus rostos que brasileiros não eram bem vindos em um lugar "apenas para japonês", como um deles me disse. Demorou anos para se acostumarem comigo, aquele "brazirero diferente" (como um atendente com seu forte sotaque me definiu) interessado apenas nas estantes com mangás. Algumas destas livrarias, na verdade, nunca me aceitaram, mesmo eu comprando seus mangás. Ficava aquela sensação de que estavam fazendo um favor ao vender para mim!
Mas na Fonomag era diferente! Nunca me olharam torto, e respondiam simpaticamente as perguntas que eu fazia sobre os títulos que procurava. Nela eu me senti à vontade para ficar o tempo que desejasse, procurando o que me interessava. E justiça seja feita, outra livraria também me aceitou, mas depois de um bom tempo e insistência, até eu me tornar um cliente fiel e bem recebido: a locadora de mangás e livros da rede Ono, na Rua Tomaz Gonzaga. Essa, infelizmente, fechou, mas foi graças a ela que puder ter em minhas mãos ainda nas décadas de 1980/90 os tankobons de Sailor Moon, Fushigi Yuugi, Bastard!, Golgo 13, Dragon Ball e centenas de outras séries totalmente desconhecidas dos brasileiros na época. Mas estou saindo do assunto novamente.
Por conta do atendimento simpático que recebi na Fonomag, quando comecei a publicar a Animax em 1996, não tive dúvidas nem vergonha de falar com o Joji - ainda hoje gerente da casa - e ofereci uma parceria lucrativa para ambos: vender edições atuais e antigas da Animax na Fonomag, divulgando e indicando a livraria nas matérias principais da revista e rachando o lucro da venda entre nós (eu tinha direito a uma quota de edições no estoque da editora), e a minha parte eu podia pegar em dinheiro ou em mangás com um generoso desconto. Além de um reforço na minha carteira, foi graças a esta parceria que pude engordar minha coleção de mangás e assinar por vários anos revistas informativas japonesas sobre anime como a Newtype, Animedia, Animage e várias outras. Esta sociedade sobreviveu depois do fim da Animax, quando eu comecei a publicar a Anime EX. Foram quase sete anos de uma parceria vantajosa para os dois lados, que só terminou quando a Anime EX foi cancelada em 2003. Como não publiquei mais nenhuma revista periódica relevante, nossa associação acabou e cada um seguiu seu caminho. Porém nunca fiquei um ano sem eu passar por lá, cumprimentar os atendentes e eventualmente, comprar um mangázinho...
Mesmo com as brutais mudanças na Liberdade, a Fonomag sobrevive valentemente apesar das crises e do aumento absurdo no dólar (que impacta diretamente nos preços), ainda vendendo mangás e livros japoneses, como faz a mais de 30 anos. Ela continua sendo um ponto de referência para os otakus brasileiros que procuram aquele mangá favorito na impressão original, ou aquele álbum caprichado de seu anime favorito. Alguns clientes são antigos leitores da Animax, que conheceram a livraria graças a divulgação que fizemos em dezenas de edições. E se não tem o que você quer na prateleira, sem problemas: o Joji manda buscar. Demora em média 3 meses para chegar, pois as encomendas vem de navio, mas se tem a venda no Japão, a Fonomag consegue trazer. Não mora em Sampa? Sem problemas de novo, porque correio existe para isso. As encomendas podem ser feitas por telefone, e-mail ou Facebook.
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Entre as estandes da Fonomag, existem tabelinhas com a conversão do preço em Yens para reais. Por conta dos preços de transporte e principalmente os impostos escorchantes cobrados no Brasil, comprar mangás e álbuns importados do Japão ficam bem acima do preço impresso nas publicações. Daí a necessidade destas tabelinhas. |
Endereço da Fonomag
Rua da Glória, 242 - Liberdade
São Paulo - SP
CEP - 01510-000
Horário de Funcionamento
Segunda a Sexta: das 08:30 até 18:30
Sábado: das 08:30 até 17:00
Não abre aos domingos e feriados
Telefone
(11) 3104-3329
Site Oficial (com lista do que está disponível)
www.fonomag.com.br
Página no Facebook (onde também pode ser feita consultas/encomendas)
https://www.facebook.com/fonomag/
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Meu amigo Vicente Cardoso com dois mangás que adora: Tenchi Muyo e o autor Isutoshi |
Você deve estar se perguntado o quanto ganhei para fazer esta matéria, certo? Bem, nada. Zero. Niente. Eu visitei a Fonomag nesta segunda feira, 30 de janeiro/2017, juntamente com o velho amigo João Vicente Cardoso (Hypercomix, lembram? Los Caballeros Ridículos, lembram?) e me bateu uma nostalgia violenta dos bons tempos, principalmente porque comprei um mangá (volume 10 e último do Hellsing) e tirei as fotos que estão aqui. Então decidi escrever essa matéria como forma de agradecimento a uma livraria que foi minha parceira na época da Animax e Anime EX, que sempre trabalhou correta e profissionalmente comigo - coisa que, no Brasil, não é pouco! E também para deixar registrado mais um pedaço da história sobre aqueles tempos venturosos em que a Animax chegava nas bancas quase quinzenalmente - sabe como é, dependia da direção do vento...
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A edição 10 do Hellsing que comprei. Sim, tenho a versão em português, mas sempre que posso adquiro a original em japonês também. A qualidade no acabamento e impressão é muuuuito superior! E daí que está em japonês? |
Obrigado turma da Fonomag e Joji, seu gerente, por todos aqueles anos e aquelas toneladas de mangás. Se voltar a publicar algo periodicamente, tenham certeza que bato aí na porta para ressuscitarmos nossa velha parceria.
E seguem mais fotos que tirei desta minha mais recente visita à Fonomag